O SEPARATISMO GAÚCHO - Jarbas Passarinho
Iniciei-me na vida militar na Escola Preparatória de Cadetes, em Porto Alegre, em que se transformara o Colégio Militar daquela capital. Por isso mesmo, encontramos no corpo de alunos grande contingente de gaúchos. O Contato com aqueles prezados camaradas de farda nunca no permitiu ter dúvidas a respeito da brasilidade rio-grandense-do-sul. Ao contrário da suspeição de sentimentos separatistas em decorrência da luta fratricida que, por dez anos talou o território do Rio Grande, no 2º Império, sempre ouvi de meus colegas peremptória declaração de orgulho de serem brasileiros. Chegavam a utilizar um argumento irrespondível, quando brincavam com seus companheiros de outros Estados: "Nós-diziam eles-somos brasileiros por opção, enquanto vocês o são em decorrência da linha de Tordesilhas..."
A história registra, nos duros embates dos farroupilhas contra as forças imperiais, passagens edificantes como a conhecida e altiva resposta de David Canabarro, um dos chefes mais prestigiosos dos rebeldes, à imprudente oferta de uruguaios, para com ele se associarem na luta contra a Coroa. O primeiro oriental que ousar atravessar a fronteira, com esse fim, selará com seu sangue a paz farroupilha com o Império, respondeu-lhe Canabarro. E ainda que Bento Gonçalves seja estrela fulgurante no relicário dos seus heróis, e não Bento Manoel, isso significa um traço tradicional dos gaúchos; o repúdio aos "vira-casaca" e não a rejeição ao sentimento de brasilidade.
Nós, do Norte, igualmente brasileiros em decorrência da proeza esquecida de Pedro Teixeira, empurrando a linha de Tordesilhas de Belém para o Javari, devemos muito aos gaúchos, na consolidação do nosso território como brasileiro. Tive oportunidade, faz mais de 15 anos, de, conversando com Moisés Velhinho, lembrar-me da contribuição gaúcha à brasilidade dos nortistas não se limitava a Plácido de Castro, na conquista do Acre - incluía Joaquim Caetano da Silva, que nos proporcionou estender os limites pátrios até o Oiapoque. Passava pelo jovem capitão gaúcho Nelson de Melo, que, interventor no Amazonas, cancelou todas as concessões territoriais - e eram enormes! - que entregavam a americanos, australianos e japoneses praticamente toda a superfície amazonense. Mais tarde, o malogro da tentativa da "Hiléia Amazônica" deveu-se não só à reação do senador Augusto Meira e do deputado Arthur Bernardes, mas igualmente a Cordeiro de Faria, que chefiava o Estado-Maior das Forças Armadas, de recente criação. Mesmo na literatura, é de Raul Bopp o "Cobra Norato". Moisés Velhinho aproveitou a tese e a desenvolveu em um de seus melhores livros.
Muito ficamos a dever aos gaúchos, e eis que agora um trêfego sr. Estrela, que acaba de fundar um partido político cuja finalidade é separar o Rio Grande do Brasil, decide explicar suas razões, agredindo-nos a nós nortistas e nordestinos. Disse ele que a única ligação que temos é a mesma língua, mas que "nortistas e nordestinos falam-na chiando". Buscando outras dessemelhanças, afirmou que até ao fazer amor somos diferentes, pois que fazemos na rede. Ao mau gosto, juntou esse sr. Estrela a vulgaridade e a chulice . A essa altura é possível que no mesmo diapasão, alguém já lhe tenha dado resposta igualmente chula mas havemos de convir que, como argumento separatista, a observação, ainda que verdadeira fosse, pretende ser pejorativa e na verdade é apenas reveladora do primarismo do seu autor. Quisesse ele e encontraria verdadeiras diferenças de costumes, como o hábito do chimarrão, por exemplo, em contraposição ao do chibé (que ele não sabe o que é), mas essas diferenças nunca chegaram a anos separar , a nos fazer estranhos uns aos outros.
Há, isso sim, uma diferença basilar, e ela está no glorioso Rio Grande do Sul: é que embora a raça dos Canabarro ainda não se tenha extinguido, parece crescer a dos Estrelas, pequeninos, insignificantes, ávidos do pior tipo de notoriedade, a que cerca de sombras os imprudentes.
Os Gaúchos, cujos ancestrais escreveram a bela saga de brasilidade, expulsaram a tropel de cavalo e a pontaços de lança os inimigos que tantas vezes tentaram o domínio da província do Rio Grande, haverá de dar a esse infeliz partido, que pretende servir-se da auréola que ilumina a epopéia farroupilha, o destino natural das coisas desprezíveis. E continuaremos todos brasileiros, nós nortistas, segundo nosso agressor, usando rede para fazer amor, e os gaúchos dominando as coxilhas onde começa o Brasil.
Nós, do Norte, igualmente brasileiros em decorrência da proeza esquecida de Pedro Teixeira, empurrando a linha de Tordesilhas de Belém para o Javari, devemos muito aos gaúchos, na consolidação do nosso território como brasileiro. Tive oportunidade, faz mais de 15 anos, de, conversando com Moisés Velhinho, lembrar-me da contribuição gaúcha à brasilidade dos nortistas não se limitava a Plácido de Castro, na conquista do Acre - incluía Joaquim Caetano da Silva, que nos proporcionou estender os limites pátrios até o Oiapoque. Passava pelo jovem capitão gaúcho Nelson de Melo, que, interventor no Amazonas, cancelou todas as concessões territoriais - e eram enormes! - que entregavam a americanos, australianos e japoneses praticamente toda a superfície amazonense. Mais tarde, o malogro da tentativa da "Hiléia Amazônica" deveu-se não só à reação do senador Augusto Meira e do deputado Arthur Bernardes, mas igualmente a Cordeiro de Faria, que chefiava o Estado-Maior das Forças Armadas, de recente criação. Mesmo na literatura, é de Raul Bopp o "Cobra Norato". Moisés Velhinho aproveitou a tese e a desenvolveu em um de seus melhores livros.
Muito ficamos a dever aos gaúchos, e eis que agora um trêfego sr. Estrela, que acaba de fundar um partido político cuja finalidade é separar o Rio Grande do Brasil, decide explicar suas razões, agredindo-nos a nós nortistas e nordestinos. Disse ele que a única ligação que temos é a mesma língua, mas que "nortistas e nordestinos falam-na chiando". Buscando outras dessemelhanças, afirmou que até ao fazer amor somos diferentes, pois que fazemos na rede. Ao mau gosto, juntou esse sr. Estrela a vulgaridade e a chulice . A essa altura é possível que no mesmo diapasão, alguém já lhe tenha dado resposta igualmente chula mas havemos de convir que, como argumento separatista, a observação, ainda que verdadeira fosse, pretende ser pejorativa e na verdade é apenas reveladora do primarismo do seu autor. Quisesse ele e encontraria verdadeiras diferenças de costumes, como o hábito do chimarrão, por exemplo, em contraposição ao do chibé (que ele não sabe o que é), mas essas diferenças nunca chegaram a anos separar , a nos fazer estranhos uns aos outros.
Há, isso sim, uma diferença basilar, e ela está no glorioso Rio Grande do Sul: é que embora a raça dos Canabarro ainda não se tenha extinguido, parece crescer a dos Estrelas, pequeninos, insignificantes, ávidos do pior tipo de notoriedade, a que cerca de sombras os imprudentes.
Os Gaúchos, cujos ancestrais escreveram a bela saga de brasilidade, expulsaram a tropel de cavalo e a pontaços de lança os inimigos que tantas vezes tentaram o domínio da província do Rio Grande, haverá de dar a esse infeliz partido, que pretende servir-se da auréola que ilumina a epopéia farroupilha, o destino natural das coisas desprezíveis. E continuaremos todos brasileiros, nós nortistas, segundo nosso agressor, usando rede para fazer amor, e os gaúchos dominando as coxilhas onde começa o Brasil.
Jarbas Passarinho. Foi Governador do pará, ministro do trabalho (governo Costa e Silva), da Educação (governo Médici) e da Previdência Social (governo Figueiredo).