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domingo, 29 de julho de 2007

Carta do Cacique Seattle

Em 1855, o cacique Seattle, da tribo Suquamish, do Estado de Washington, enviou uma carta ao presidente dos Estados Unidos (Francis Pierce), depois de o Governo haver dado a entender que pretendia comprar o território ocupado por aqueles índios. Faz mais de um século e meio. Mas o desabafo do cacique tem uma incrível atualidade.

Grande chefe de Washington mandou dizer que quer comprar a nossa terra; O grande chefe assegurou-nos também sua amizade e benevolência. Isto é gentil de sua parte, pois nós sabemos que ele não precisa de nossa amizade. Vamos pensar em sua oferta. Se não pensarmos, homem branco virá com armas e tomará nossa terra. O grande chefe em Waschington pode acreditar no que Cacique Seathl diz, com a mesma certeza com que nossos irmãos brancos podem confiar na mudança das estações do ano. Minha palavra é como as estrelas, elas não empalidecem. Como podes comprar ou vender o céu? O calor da terra? Tal idéia é estranha. Nós não somos donos da pureza do ar ou do brilho da água. Como podes então comprá-los de nós? Decidimos apenas sobre coisas de nosso tempo. Toda esta terra é sagrada para o meu povo. Cada folha reluzente, todas as praias de areia, cada véu de neblina nas florestas escuras, cada clareira e todos os insetos a zumbir são sagrados nas tradições e na crença de meu povo.

Sabemos que o homem branco não compreende nosso modo de viver. Para ele, um pedaço de terra é igual a outro porque ele é um estranho que vem de noite e rouba da terra tudo o que necessita. A terra não é sua irmã, é sua inimiga e depois de a esgotar ele vai embora, deixa para trás a cova de seu pai, sem remorsos. Rouba a terra de seus filhos. Nada respeita. Esquece o critério dos antepassados e o direito dos filhos. Sua ganância empobrece a terra e deixa atrás só desertos. Tuas cidades são um tormento para os olhos do homem vermelho. Talvez seja assim por ser o homem vermelho, um selvagem que nada compreende.

Não se pode encontrar paz nas cidades do homem branco, nem lugar onde se possa ouvir o desabrochar da folhagem na primavera ou o zunir das asas dos insetos. Talvez por ser um selvagem que não entende, o barulho das cidades é terrível para os meus ouvidos. E que espécie de vida é aquela que o homem não pode ouvir a voz do corvo noturno ou a conversa dos sapos do brejo, à noite? Um índio prefere o suave sussurro do vento sobre o espelho d´agua e o próprio cheiro do vento, purificado pela chuva do meio-dia e com aroma de pinho. O ar é precioso para o homem vermelho, porque todos os seres vivos respiram o mesmo ar, animais, árvores, homens. Não parece que o homem branco se importe com o ar que respira. Como moribundo, ele é insensível ao ar.

Se eu me decidir a aceitar, imporei uma condição. O homem branco deve tratar os animais como se fossem irmãos. Sou um selvagem e não compreendo que possa ser certo de outra forma. Vi milhares de bisões apodrecendo nas pradarias, abandonados pelo homem branco que os abatia a tiros disparados do trem. Sou um selvagem e não compreendo como um fumegante cavalo de ferro possa ter mais valor que um bisão que nós, os índios, matamos apenas para sustentar a nossa própria vida. O que é o homem branco sem os animais, se todos os animais acabassem, os homens morreriam de solidão espiritual, porque tudo o que acontece aos animais pode também afetar os homens. Tudo está relacionado entre si. Quando fere a terra , fere também os filhos da terra.

Os nossos filhos viram os pais humilhados na derrota. Os nossos guerreiros sucumbem sob o pelo da vergonha e, depois da derrota passam o tempo em ócio e envenenam seus corpos com alimentos adocicados e bebidas ardentes. Não tem grande importância onde passaremos nossos últimos dias – eles não são muitos, mas algumas horas, até uns invernos e nenhum dos filhos das grandes tribos que viveram nesta terra, ou que tem vagueado nos pequenos bandos nos bosques, sobrará para chorar, sobre os túmulos, um povo que um dia foi tão poderoso e cheio de confiança como o nosso.

De uma coisa sabemos, que o homem branco talvez venha um dia a descobrir: O nosso Deus é o mesmo Deus. Julgas, talvez, que podes ser o dono dele, da mesma maneira como desejas possuir a nossa terra. Mas não podes, ele é Deus de todos e quer bem da mesma maneira ao homem branco como ao vermelho. A terra é amada por ele. Causar dano à terra é demonstrar desprezo pelo criador. O homem branco também vai desaparecer, talvez mais depressa do que as outras raças. Continua sujando tua própria cama e hás de morrer uma noite, sufocado nos teus próprios excrementos! Depois de abatido o último bisão e domados todos os selvagens, quando as matas misteriosas federem a gente, quando as colinas, escarpas se encherem de fios que falam, onde ficarão então os sertões? Terão acabado. E as águias? Terão ido embora. Restará dar adeus às andorinhas da torre e a caça; o fim da vida e o começo da luta para sobreviver.

Talvez compreendêssemos como que sonha o homem branco, se soubéssemos quais as esperanças que transmite a seus filhos nas longas noites de inverno, quais visões do futuro oferece para que possam ter formados os desejos do dia de amanhã, mas nós somos selvagens. Os sonhos do homem branco são ocultos para nós e por ser ocultos, temos de escolher nosso próprio caminho. Se consentirmos na venda, é para garantir as reservas que nos prometeste. Lá talvez possamos viver os nossos últimos dias conforme desejamos. Depois que o último homem vermelho tiver partido e a sua lembrança não passar da sombra de uma nuvem a pairar acima das pradarias, a alma do meu povo continuará a viver nestas florestas e praias, porque nós amamos como um recém-nascido ama o bater do coração de sua mãe. Se vendermos a nossa terra, ama-a como nós a amávamos. Protege-a como nós a protegíamos. Nunca esqueça como era a terra quando dela tomaste posse e, com tua força, teu poder e todo teu coração, conserva-a para teus filhos e ama-a como Deus ama a todos. Uma coisa sabemos: O nosso Deus é o mesmo Deus. Esta terra é querida por ele. Nem mesmo o homem pode evitar o nosso destino comum.


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